Categoria: ilocução

A METÁFORA DO AMOR NA CORRESPONDÊNCIA DE RUI BARBOSA (Parte 3). Nílvia Pantaleoni

A METÁFORA DO AMOR NA CORRESPONDÊNCIA DE RUI BARBOSA  (Parte 3)
A Língua como instrumento de interação verbal

O objetivo principal da língua, do ponto de vista do funcionalismo, é de estabelecer relações comunicativas entre seus usuários. O modelo de interação verbal de Simon Dik (The Theory of Functional Grammar, 1997) leva em consideração a intenção do falante que antecipa a interpretação do destinatário que, por sua vez, reconstrói esta intenção. É fundamental neste esquema, para que haja efetivamente a interação verbal, a informação pragmática do falante e do destinatário, que se orientam por regras pragmáticas que governam os padrões de interação verbal.  O usuário da língua é muito mais que um animal com uma capacidade linguística. Ele é dotado de uma série de outras capacidades que, juntas, lhe permitem um uso comunicativo eficiente e eficaz da língua.

Estas capacidades são:

a) epistêmica, que permite que ele derive conhecimento de expressões linguísticas, arquive-o, recupere-o e utilize-o, posteriormente, na interpretação de   outras expressões linguísticas;

b) lógica, que permite que ele, munido de parcelas de conhecimento, por meio do raciocínio, extraia outras parcelas de conhecimento;

c) perceptual, que permite que o usuário derive conhecimento de suas percepções e utilize-os tanto na interpretação quanto na produção de expressões linguísticas; e

d) social: o usuário sabe o que dizer ao seu parceiro, numa interação verbal, e como dizer para atingir seu objetivo comunicativo.

Simon Dik postula para uma teoria geral da gramática três tipos de adequação. São elas:

a) a adequação tipológica que exige que uma teoria gramatical seja capaz de prover gramáticas para línguas de qualquer tipo;

b) a adequação pragmática que permite a inserção da gramática numa teoria pragmática mais ampla da interação verbal; e

c) a adequação psicológica que se refere ao relacionamento  entre os modelos psicológicos da competência linguística e o comportamento linguístico do usuário. Estas duas últimas adequações são denominadas explanatórias, pois se referem aos modelos de produção que definem como os falantes constróem e formulam as expressões linguísticas e os modelos de compreensão que definem como os destinatários processam e interpretam estas mesmas expressões.

De acordo com o pensamento de J. L. Austin (How to do things with words, 1962),desenvolvido por John Searle (Speech Acts, 1969) nós nos comunicamos não por meio de proposições mas por meio de atos de fala, interpretáveis como instruções do falante ao destinatário para que este realize certas ações mentais a respeito do conteúdo da proposição, denominamos a estas instruções “frames”, ou molduras ilocucionárias.

A interpretação que a Gramática Funcional faz dos atos ilocucionários pode ser resumida da seguinte forma:

(i)            Há uma distinção básica entre a intenção ilocucionária do falante; a ilocução codificada na expressão linguística; e a interpretação ilocucionária do destinatário. O principal objetivo de uma comunicação bem sucedida é naturalmente que a intenção ilocucionária do falante seja igual à interpretação ilocucionária do destinatário. Mas pode haver uma diferença, e muitas vezes isso acontece, entre a intenção do falante, o conteúdo da expressão linguística e a interpretação do destinatário pois o conteúdo da expressão linguística não é sempre idêntico para os usuários da língua.

(ii)          Em relação à ilocução codificada na expressão linguística, observamos que todas as línguas apresentam sentenças que se classificam como declarativas, interrogativas e imperativas e que quase todas as línguas apresentam sentenças exclamativas. Estes tipos de sentença são considerados valores ilocucionários básicos.

(iii)         Interpretamos estas ilocuções básicas como instruções do falante para que o destinatário efetue determinadas mudanças em sua informação pragmática. Na sentença

a)            declarativa, há instruções do falante para que o destinatário inclua o conteúdo proposicional à informação pragmática;

b)            interrogativa, há instruções do falante para que o destinatário consiga a informação verbal especificada na proposição;

c)      imperativa, há instruções do falante para que o destinatário realize a ordem especificada na proposição

d)      exclamativa, há instruções do falante para que o destinatário inclua à sua informação pragmática que o falante considera que o conteúdo proposicional é surpreendente, inesperado ou que vale a pena ser notado.

As reflexões que apresentamos a respeito da metaforização e das funções pragmáticas na interação verbal subsidiam a análise do corpus. (Parte 4).